Olhar sobre a escola e os alunos/jovens de hoje por GM

12:35

Retirado do "rosto de menina - grafitti"

Sou professora do ensino secundário e iniciei a minha atividade profissional no ano letivo de 1991-1992, como estagiária. No ano seguinte começou a minha carreira docente e até agora tive o privilégio de dar aulas de Inglês e Alemão a um grande número de alunos com perfis, características que foram mudando ao longo dos anos. Na década de 90 havia muito pouca indisciplina e os discentes em geral demonstravam mais interesse pela aprendizagem e tinham mais objetivos de vida que queriam alcançar. Um destes objetivos passava por entrar para a universidade e tirar uma licenciatura. Os contextos familiares mais estáveis e funcionais favoreciam este nível de desempenho, assim como o facto da escolaridade obrigatória ser apenas até aos 15 anos.

Com a subida da escolaridade obrigatória para os 18 anos, com sucessivas políticas educativas, na minha opinião, pouco coerentes, pouco ajustadas à realidade das escolas, e mais recentemente facilitadoras da transição dos alunos, os problemas de indisciplina, de desinteresse pela a aprendizagem e de abandono escolar aumentaram consideravelmente.

A atual geração de alunos com quem trabalho, chamada de geração Z, nasceu na era das tecnologias digitais, das redes sociais, que usam com mestria, mas abusivamente e por vezes de forma pouco cautelosa. São alunos que vivem numa sociedade com uma economia débil, onde as oportunidades de emprego em qualquer área escasseiam, e que têm diferentes tipos de famílias, nem sempre funcionais e presentes. Tenho alunos que apesar de imensas adversidades pessoais, têm sonhos que querem concretizar e que por isso se empenham a fundo para terem um ótimo desempenho escolar. Tenho outros, infelizmente em maior número, que utilizam a indisciplina na sala de aula, na minha opinião, como forma de chamar a atenção sobre si mesmos e/ou como grito de ajuda. São geralmente alunos que falam muito nas aulas ou se escondem atrás do telemóvel, que têm muitas dificuldades em expressar os seus sentimentos e desejos e pouco interesse pela escola enquanto instituição de ensino formal.

De acordo com o documento Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, homologado pelo Despacho n.º 6478/2017, 26 de julho, pretende-se que o jovem, à saída da escolaridade obrigatória, seja um cidadão:

• munido de múltiplas literacias que lhe permitam analisar e questionar criticamente a realidade, avaliar e selecionar a informação, formular hipóteses e tomar decisões fundamentadas no seu dia a dia;

• livre, autónomo, responsável e consciente de si próprio e do mundo que o rodeia;

• capaz de lidar com a mudança e com a incerteza num mundo em rápida transformação;

• que reconheça a importância e o desafio oferecidos conjuntamente pelas Artes, pelas Humanidades e pela Ciência e a Tecnologia para a sustentabilidade social, cultural, económica e ambiental de Portugal e do mundo;

• capaz de pensar crítica e autonomamente, criativo, com competência de trabalho colaborativo e com capacidade de comunicação;

• apto a continuar a aprendizagem ao longo da vida, como fator decisivo do seu desenvolvimento pessoal e da sua intervenção social;

 • que conheça e respeite os princípios fundamentais da sociedade democrática e os direitos, garantias e liberdades em que esta assenta;

• que valorize o respeito pela dignidade humana, pelo exercício da cidadania plena, pela solidariedade para com os outros, pela diversidade cultural e pelo debate democrático;

• que rejeite todas as formas de discriminação e de exclusão social.

Considero que há um longo caminho a percorrer e muitas mudanças a implementar ainda na escola para que seja possível a todos os alunos que concluem a escolaridade obrigatória ter este perfil, bastante ambicioso.

Eu, em concreto, procuro contribuir diariamente para a sua construção mostrando-me nas aulas como um ser humano falível, com fragilidades e problemas como os demais, e disposto a aprender com os alunos e não apenas a transmitir conhecimentos. Sempre que vem a propósito falo-lhes sobre a importância de aprenderem a gostar de si próprios, de respeitarem os outros, usando, por exemplo, uma linguagem adequada na interação com eles e comportando-se de forma responsável, e acerca da importância de se indignarem e revoltarem contra todo o tipo de violência exercida sobre pessoas vulneráveis, seja física ou verbal. Procuro ainda encorajá-los a ter sonhos e ideais, por mais pequenos que possam parecer, e a lutar por eles.

 Como é possível concluir, para além de ensinar acabo também por educar. Compete, porém, aos pais e não aos professores o papel de educar os seus filhos. Infelizmente há demasiados pais hoje em dia que se demitem desta tarefa e de outras igualmente importantes, com consequências muito negativas para esses jovens, nomeadamente em termos de autoestima e afeto. Há cada vez mais casos de alunos (e inclusive de professores) com necessidade de apoio psicológico nas nossas escolas, mas lamentavelmente não há psicólogos em número suficiente para tratar todos os casos assinalados. Julgo que se trata de um problema de saúde pública que é prioritário resolver e não esconder.

                                                                                                                                                        GM   


 

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